Vestígios do Pecado: O Passado Não Esquece

  • Temas: amor, traição, amizade, pés, pernas, vestido, proibido
  • Publicado em: 07/02/25
  • Leituras: 351
  • Autoria: Vicente_Braga
  • ver comentários

Quando atendeu ao telefone e ouviu a voz de Helena, Dante soube imediatamente que algo estava errado. O tremor sutil nas palavras, o medo mal disfarçado.

— Preciso te ver. É urgente.

Sem pensar duas vezes, largou tudo, pegou a viatura e cruzou a cidade debaixo de uma tempestade implacável. A água descia em rios pelo asfalto, os faróis mal cortavam a cortina de chuva, mas nada o faria desistir daquele chamado.

Em menos de uma hora, chegou à Rua Cândido Vale, no Tatuapé. O prédio de três andares era modesto, sem qualquer segurança aparente. Desligou os faróis antes de estacionar e subiu as escadas com pressa, o coração pulsando forte.

Helena e Fábio residiam ali. Mas por que ela o chamaria, e não ele?

O pressentimento ruim crescia. E, apesar da preocupação, havia algo mais. Uma necessidade silenciosa, quase vergonhosa, de vê-la novamente.

A porta se abriu.

Helena apareceu, encharcada. O tecido leve do vestido colava-se ao corpo, delineando cada curva com uma precisão quase cruel. Gotas escorriam dos cabelos presos de qualquer maneira, deslizando pelo pescoço e desaparecendo no decote audacioso.

— Perdão por te receber assim, Dante. O telefone de casa está mudo, e o único orelhão que encontrei foi na Celso Garcia, perto do hospital. E adivinha? — abriu os braços com um meio sorriso. — A chuva não teve compaixão.

— Na Bela Vista está chovendo quase o dia todo.

Dante demorou um segundo para responder, os olhos presos nela, na maneira como a luz fraca do corredor moldava sua silhueta.

— Mas o que aconteceu? Você parecia aflita.

— Sim. Obrigada por vir. Venha, entre.

Helena fechou a porta e respirou fundo. Encontrou o olhar dele e parou por um instante, como se procurasse as palavras certas.

— É o Fábio. Ele não dormiu em casa. Antes de te ligar, liguei para o trabalho dele e me disseram que ele não apareceu. Ele nunca falta ao trabalho.

Os olhos dela se encheram d'água.

— Estou muito preocupada, Dante.

Ele manteve o olhar fixo nela, atento.

— Ele simplesmente sumiu sem deixar vestígios?

Ela cruzou os braços ao redor do próprio corpo, como que buscando proteção contra um frio interno.

— Tenho quase certeza de que ele foi ao Desire Club — a expressão dela se contorceu entre frustração e angústia. — Descobri que ele anda frequentando aquele lugar. Disse que estava apenas jogando poker, mas não sei… Algo não me parece certo.

Dante franziu a testa.

— O Fábio? Jogando? E no Desire Club? Nunca imaginei.

O olhar dele voltou até o decote do vestido, o tecido molhado ameaçando revelar mais do que deveria.

Helena começou a chorar, e, instintivamente, Dante a puxou para um abraço. O corpo dela tremia contra o dele, quente, apesar da roupa encharcada. O perfume, misturado à chuva, se espalhava no ar, doce e inebriante. A mão dela deslizou pelo peito dele, um toque leve, quase inocente. Ou talvez não tanto.

— Calma. Vamos achá-lo.

A respiração dela acelerou contra seu pescoço.

— Fui ontem ao 13º Distrito, mas disseram que precisava esperar 48 horas. Como se fosse banal. Ainda fizeram piadinhas machistas.

Dante deslizou a mão pelos cabelos molhados dela.

— Idiotas.

— Mas eu sei… algo aconteceu. Ele não sumiria assim.

Ele a observou por um instante, então segurou seu rosto entre as mãos.

— Tira essa roupa e toma um banho quente. Vou ver se encontro alguma pista por aqui.

Ela umedeceu os lábios, parecendo refletir.

— Obrigada, Dante. Fique à vontade.

Ela se afastou devagar, e ele a seguiu com o olhar até desaparecer pelo corredor. Quando ouviu o barulho da porta do banheiro se fechando, soltou um longo suspiro e passou a mão pelo rosto.

Aquilo não terminaria bem.

Na cozinha, um Château Musar repousava sobre a bancada. Ao lado, uma taça com um resto de vinho no fundo.

— Parece que a jogatina tem trazido bons resultados, velho amigo…

Seguiu em direção ao quarto do casal, e a memória o atingiu em cheio ao passar por aquele corredor. Helena e Fábio estavam casados há uns seis meses e não foram poucas as noites onde se reuniam naquela casa, entre risadas, bebidas e conversas que iam até altas horas.

Fábio sempre foi apaixonado por ela, desde a faculdade.

Mas e quem não era?

Helena possuía um magnetismo natural. Não era extravagante, tampouco vulgar. Havia algo nela que escapava a explicações simples. Um mistério que fazia qualquer homem desejar passar horas ao seu lado.

Numa daquelas noites, depois de beber demais, Helena e Fábio insistiram para que ele ficasse ali. Não havia como dirigir naquele estado.

Ajeitou-se no pequeno quarto de visitas, mas o sono não veio. O perfume dela ainda estava ali, espalhado pelos lençóis. Ou talvez, fosse apenas coisa da sua cabeça. O fato é que seu corpo reagia ao aroma, evocando imagens proibidas e desejos sujos com Helena.

Na madrugada, com sede, levantou para procurar água, e no escuro, ao cruzar a passagem entre a sala e a cozinha, esbarrou em alguém.

Os corpos se chocaram.

E suas mãos percorreram as costas nuas de Helena.

Nua.

— Dante! Me perdoe, eu não esperava que…

Antes que terminasse a frase, ele segurou sua nuca e a beijou.

Helena não recuou.

Pelo contrário.

Retribuiu o beijo com a mesma intensidade, como se algo contido há muito tempo se libertasse de uma vez. A tensão entre os dois se manifestou como um erro prestes a ser cometido e impossível de evitar.

Então, de súbito, ela o empurrou, e se afastou apressada, desaparecendo pelo corredor.

Dante ficou parado no meio da cozinha, sentindo a boca dela ainda em seus lábios, o gosto dela em sua língua.

A campainha da realidade o trouxe de volta.

Sacudiu a cabeça, afastou o passado e olhou ao redor.

O chuveiro estava ligado.

No quarto do casal, o cheiro amadeirado do perfume dela ainda pairava no ar, misturado ao toque adocicado da pele quente.

A TV chiava, a imagem tremia com a entrada do jornal que se iniciava.

O jornalista com aquela voz monótona de sempre, disse:

— Após um ano, o Plano Real começa a mostrar sinais de estabilidade econômica e…

— Estou aqui, viu — exclamou Dante.

— Fique tranquilo, Dante. Sem surpresas hoje.

Dante sorriu de canto.

Enquanto vasculhava o guarda-roupa, encontrou um bilhete no bolso de um casaco de couro, certamente pertencia a Fábio.

"Venha me ver essa noite, vou dançar só pra você."

Ao lado, um flyer do Desire, estampado com a imagem de uma dançarina mascarada, deslizando sensualmente pela barra de pole dance.

A porta do banheiro se abriu.

Dante escondeu o bilhete no bolso.

Helena surgiu, os pés delicados afundando levemente no carpete. O vestido curtíssimo roçava contra a pele a cada passo, revelando lampejos tentadores em um jogo sutil de provocação.

— Aqui está o telefone do chefe dele. Se mostrou muito disposto a ajudar.

Dante pegou o cartão, sem desviar o olhar, enquanto erguia o folder do Desire.

— O Desire é um terreno complicado. Policiais não são bem-vindos por lá. Vou começar pelo trabalho dele e também ter uma conversa com o Elias. Aquele sujeitinho cheira a problema.

Os dedos traçaram um caminho pelo braço de Dante, um toque leve, mas o suficiente para reacender o desejo que ele preferia manter adormecido.

— Obrigada por isso… — a voz saiu baixa, quase um sussurro.

Antes que percebessem, já estavam próximos demais.

O abraço se prolongou, quente. As mãos dele deslizaram pelas costas dela, apertando, sentindo o calor que emanava da pele úmida. E o beijo veio, inevitável, intenso e faminto.

Dante não pensou. Apenas agiu.

O vestido subiu entre seus dedos, e num impulso cego, rasgou a pequena calcinha.

Ergueu-a contra a parede.

Helena gemeu contra a boca dele. As pernas se apertaram ao redor de sua cintura, puxando-o para mais perto, enquanto fechava os olhos ao sentir os lábios dele deslizarem por sua pele quente e salgada, saboreando cada arrepio.

Ele desfez o cinto e a calça.

O desejo não pedia permissão.

Tomava.

Agarrando-lhe as coxas, puxou-a para si e a tomou em um movimento firme e profundo. Helena soltou um gemido abafado, as unhas se cravando nos ombros dele. Logo, o embate dos corpos se intensificou, cada investida incendiando os nervos. Ela arquejou, entregando-se por completo, sem resistência.

E o mundo desapareceu.

Só restavam os corpos e a condenação.

A tensão cresceu como um nó cego até se desfazer de uma vez, em espasmos ofegantes e suor quente. Helena respirou fundo, trêmula, os olhos semicerrados, a boca entreaberta.

Dante a colocou de volta no chão, tentando recuperar o fôlego.

Ela se encostou na parede, o corpo ainda pulsando.

— Isso não devia ter acontecido… — A voz saiu baixa, vacilante.

Helena ergueu o olhar, um brilho indecifrável nos olhos, e concluiu:

— Mas eu confesso… queria isso há muito tempo.

Dante permaneceu em silêncio.

Ela passou a língua pelos lábios, como se ainda sentisse o gosto dele, e desviou o olhar.

— Por favor, Dante, ele não pode saber. Odiaria magoá-lo.

Afastou-se lentamente.

— Fábio é um bom homem. Eu que, talvez, não seja a esposa que ele merece.

Dante soltou um longo suspiro.

— Você vai ficar bem?

Helena respirou fundo.

— Sim… Mas é melhor você ir embora.

Deu um passo para trás, como se rompesse o último fio invisível que ainda os unia.

— Mas traga ele de volta pra mim, por favor.

Dante não disse nada. Apenas virou as costas e saiu.

Já dentro do carro, apertou o volante com força.

Fechou os olhos por um instante. O gosto dela ainda persistia em sua boca, a pele latejava com o calor do toque recente.

Engatou a primeira marcha. Os pneus deslizaram ruidosamente sobre o asfalto encharcado.

— Merda… onde diabos você se meteu, Fábio?!

A tempestade castigava a cidade.

Dante acelerou.

Como se a velocidade pudesse apagar o que acabara de acontecer.


Vicente Braga

Com

*Publicado por Vicente_Braga no site promgastech.ru em 07/02/25. É estritamente proibida a cópia, raspagem ou qualquer forma de extração não autorizada de conteúdo deste site.


Comentários: